quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Honorários advocatícios no cumprimento de sentença

A idéia de alterar o CPC para agilizar o rito da execução de sentença sempre me pareceu genial, sobretudo porque considerava uma incrível perda de tempo (a) ajuizar ação de cobrança para (b) obter sentença condenatória, e, só aí, (c) citar o devedor para pagar ou penhorar bens. Afinal, depois da sentença que condena alguém a pagar a outrem alguma coisa deveria prescindir de outro processo; é intuitivo que a alguém que foi condenado (com decisão transitada em julgado) a pagar algo só compete isso, pagar a condenação. Só que o sistema tradicional do CPC impunha ao credor o trâmite de uma ação ordinária, para que fosse reconhecida a existência da dívida e também proferida a palavra mágica (“condeno o devedor a pagar ‘x’”), e só assim viabilizar o ingresso na fase executiva, mas mediante um processo próprio (de execução), com citação e prazo para embargos (isso tudo tinha uma razão histórica, muito bem esmiuçada e desenvolvida em praticamente todos os livros do Ovídio Baptista da Silva).

Pois bem, como se sabe, a Lei n.º 11.232/05 veio para alterar o CPC e tornar a fase de execução de sentença (ou cumprimento de sentença) um mero desdobramento da ação que tramita sob o rito ordinário ou monitório, se for o caso. O devedor não mais seria citado para pagar ou nomear bens à penhora (em 2004 assisti a uma palestra proferida por Athos Gusmão Carneiro sobre essa e outras reformas no CPC - sobre isso escrevi uma resenha aqui). Além disso, os embargos à execução de título judicial foram substituídos pela impugnação ao cumprimento de sentença. A tônica da mudança foi a de imprimir celeridade processual e economia de atos, em atenção ao princípio da efetividade.

Só que a alteração legislativa, me parece que deixou a descoberto inúmeras questões relevantes (e, assim, tenho a impressão que a reforma se deu de forma incompleta, ou, dito de outra forma, poderia ter sido feita de maneira mais esclarecedora sobre certos assuntos). Uma delas, bastante expressiva, é a que diz respeito à possibilidade de fixação de honorários advocatícios na fase de cumprimento de sentença. Afinal, são estes devidos? Caso positivo, a partir de qual momento processual: (I) inicialmente, antes mesmo do devedor cumprir espontaneamente a sentença, (II) quando o devedor permanecer inerte no prazo de 15 dias, ou (III) somente se houver impugnação?

Tão logo me deparei com essa questão, firmei a convicção de que:

(a) o devedor deve promover o cumprimento de sentença, independentemente do pedido do credor, caso lhe seja possível efetuar o cálculo do valor devido, no prazo de 15 dias após a intimação da baixa dos autos à origem (ou outra intimação que dê conta às partes do trânsito em julgado da sentença, com prazo para requererem o que entenderem de direito, v.g.) – mas admito que é defensável (e talvez preferível) o entendimento de que, na verdade, o credor deve juntar aos autos o cálculo do que entende devido e requerer a intimação do devedor para cumprir a sentença, na forma do art. 475-B e do art. 475-J do CPC;

(b) o devedor, aquiescendo com o cálculo, paga o valor exigido pelo credor no prazo de 15 dias do art. 475-J do CPC. Nesse caso não há que se falar em multa, nem em honorários advocatícios.

Diversamente, se o devedor permanece inerte, o processo deve seguir conforme o art. 475-J do CPC, i. é, com acréscimo da multa de 10% e expedição de mandado de penhora. Talvez aí, admito, se pudesse falar em arbitramento de honorários advocatícios em favor do credor.

Em outra hipótese, caso o devedor entenda, v.g., que houve excesso de execução, deve promover a impugnação (indicando o valor que entende correto – art. 475-L, V e art. 475-L § 2.º do CPC), e caso reste vencido, deve haver condenação ao pagamento de honorários advocatícios. Então, numa interpretação pessoal e preliminar, os honorários advocatícios, na fase de cumprimento de sentença, só seriam cabíveis se houvesse impugnação.

Após notícias isoladas de julgados do STJ e do TRF-4, o Informativo n.º 359 do STJ deu conta de um julgado (REsp 1.050.435-SP, Rel. Min. Sidnei Beneti, julgado em 10/6/2008) no qual se entendeu que os honorários advocatícios são cabíveis na fase de cumprimento de sentença, independentemente da eventual impugnação. Os argumentos são: (a) a alteração da execução de título judicial para cumprimento de sentença, por si só, não significa nada em relação aos honorários advocatícios, pois o cumprimento de sentença se faz por execução (art. 475-I do CPC), e nas execuções, embargadas ou não, são devidos honorários advocatícios (art. 20, § 4.º do CPC); (b) a verba honorária arbitrada na sentença diria respeito apenas ao trabalho realizado no processo de conhecimento; (c) o “espírito” da Lei n.º 11.232/05 seria o de impor ônus ao devedor recalcitrante, pois “De nada adiantaria a criação de uma multa de 10% sobre o valor da condenação para o devedor que não cumpre voluntariamente a sentença se, de outro lado, fosse eliminada a fixação de verba honorária arbitrada no percentual de 10% a 20%, também sobre o valor da condenação”.

Parece-me, então, que caso o devedor cumpra espontaneamente a sentença, pagando o valor do débito no prazo dos 15 dias (contados do trânsito em julgado, ou da baixa dos autos à origem, ou da intimação para cumprir sentença sob pena de incidência da multa de 10%), não é cabível o arbitramento de honorários advocatícios. Conforme o entendimento do STJ, que me parece, afinal, bastante defensável, a verba honorária seria devida apenas se o devedor restar inerte no prazo de 15 dias (então ficaria submetido à multa de 10% e também aos honorários advocatícios arbitrados pelo Juízo), ou oferecer impugnação e restar vencido (aí é indiscutível a incidência da verba honorária, pelo princípio da causalidade e da sucumbência).

Para ler mais sobre cumprimento de sentença clique aqui.

Adendo em 09.09.2009: essa questão segue atual na jurisprudência do STJ, tendo em vista notícia do Informativo n.º 398 (REsp 1.053.033-DF, Rel. Min. Sidnei Beneti, julgado em 9/6/2009).

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